A Igreja Agnóstica


Resenha:

Por Ronald Fucs
Jornalista

De que pode tratar um livro com um título paradoxal como "A Igreja Agnóstica"? Estará lançando uma nova forma de religião, talvez a deste novo milênio? Alguma Igreja revolucionária, na qual os fiéis, em vez de serem devotos de uma força sobrenatural, crêem na incognoscível realidade da vida, na absoluta impossibilidade da certeza de qualquer fato que não possa ser ou medido, fotografado, escaneado, transmitido, provado e aprovado pela comunidade científica?

Não vale ver, sentir, ter fé: é preciso testar, provar, demonstrar, transmitir os dados via Internet, expor à análise dos outros membros da comunidade etc. Será, enfim, a ciência no altar?
De certa forma, religião assim já existe, e há muito tempo. Seus templos estão nos laboratórios, seus devotos na vida acadêmica e seus missais são revistas como "Nature". Mas a Igreja fundada por Expê Faggioni, talvez mais atéia do que realmente agnóstica é isso e mais do que isso. Em seus templos somente a não-crença é aceita, a dúvida é a única entidade em que se pode depositar fé e os fiéis se iluminam quando, emocionados, sentem a oniausência de Deus.

Mas, por destino, karma, desígnios de Deus ou talvez até pela falta deste no universo, o templo de tal Igreja se situa ao lado de outro, este sim uma verdadeira congregação religiosa, coalhada de carolas. E isso é apenas parte dos personagens e o início de uma trama de imaginação delirante, povoada ainda por ateus empedernidos e por "crenteus" e cuja clímax é uma fenomenal luta de boxe em que sadismo e masoquismo têm participação decisiva.

Ao longo de todo o livro Expê nos brinda com tiradas hilariantes, nada de pastelão ou chanchada, mas sutileza inteligente que serve de munição a uma metralhadora giratória que não poupa qualquer das crenças humanas, inclusive a religião das drogas - e à qual não falta uma inesperada dose de poesia.

Você vai começar a ler o livro e vai descobrir que não só é muito difícil largar como, ao fim, se alguém lhe perguntar de que se trata, terá dificuldade de responder. Porque "A Igreja Agnóstica" não tem antecedentes nem precursores: é um romance singular, ao mesmo tempo cômico e lírico, frenético e contemplativo. Sem fé nem certezas, mas com o mais fino humor.