eu e o Mestre

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A Semente Espiritual


Certa tarde de 1965, a brincadeira acabou: foi quando tive meu primeiro encontro com o Mestre. Eu tinha 12 anos e estava brincando de cantar com meus cinco irmãos. Minha mãe estava na maternidade, tendo seu sétimo filho. Minha família passava por todo tipo de dificuldade, inclusive financeira, e eu estava atrasada na escola, onde cursava o admissão. Apesar dos momentos difíceis que vivíamos, eu era feliz. Gostava de brincar porque, brincando, era como se houvesse uma magia que tapava meus olhos, como no jogo de cabra-cega. Isso me retirava da tristeza de só ter conhecido uma vida de privações, carregada da consternação que eu sentia pelas decepções de minha mãe.

Bateram à porta e fui ver quem era. Ao abrir, o sorriso de uma senhora morena entrou na minha vida para sempre. Ela foi a primeira a falar:

– Boa tarde. Sua mamãe está em casa?

– Não senhora, ela está no hospital.

– O que a mamãe foi fazer no hospital?

– Ela foi ter neném.

– Como você se chama?

– Meu nome é Marcia.

– Marcia, você sabe como se chama Deus?

Fiquei confusa, sem entender o que aquela senhora queria de mim com esta pergunta.

– O nome de Deus é Deus – respondi firmemente.

– Não, querida. Deus tem um nome: Jeová!

Senti que o que estava sendo revelado era verdadeiro. Ela falava e eu escutava atentamente. Como me interessava o que ela me dizia! Parecia que eu a estava esperando. Era como se eu a tivesse convidado para interromper minha tão prazerosa brincadeira com meus irmãos. Nas palavras dela havia uma magia mais poderosa do que aquela do brincar.

A senhora continuava a falar e eu ouvia tudo atentamente. Ela me disse que a Terra foi uma bola de líquidos efervescentes e que, com o passar do tempo, foi se condensando até formar uma crosta. Era como ouvir um belo conto de fadas. Convidei-a para entrar e continuamos a conversar. Por fim, ela me perguntou se eu gostaria de tomar lições sobre aquele assunto. Respondi que sim.

– Você tem uma Bíblia? – ela me perguntou.

– O que é isso? – eu quis saber.

– A Bíblia é um livro sagrado que Deus nos deixou a fim de que pudéssemos aprender e compreender certas coisas.

O que aquela senhora dizia era algo novo para mim, porque, quando fiz a primeira comunhão na Igreja Católica, me disseram que o Catecismo era o único livro que Deus deixara para nos ensinar algo sobre Ele. Nunca soube mais detalhes sobre Deus, porque mamãe não era uma pessoa religiosa. Fui batizada na Igreja Católica, mas nunca a freqüentei. Quando estava terminando o primário, era costume na escola fazer a primeira comunhão. Tive algumas aulas de catecismo e foi só o que recebi.

Ela me presenteou com uma Bíblia e disse que começaríamos os estudos com um livro que se chamava “O paraíso perdido e o paraíso recuperado”. Fiquei entusiasmada com tudo aquilo que estava me acontecendo. Mas havia um problema: como pagar o livro? Nós não tínhamos dinheiro nem para a alimentação. Mamãe não aprovaria mais dívidas.

– Moça, não posso ficar com esse livro. Não tenho dinheiro – eu disse entristecida.

– Minha filha, você quer fazer esse estudo?

– Quero, mas não posso pagar pelo livro.

– Não tem importância. Hoje você ganha dois presentes: uma Bíblia e um livro.

Eu não podia acreditar. Ela estava me dando aqueles livros de graça! Eu iria aprender sobre Deus e mamãe não iria brigar comigo. “Que maravilha!”, pensei. Assim, mesmo sem o consentimento de minha mãe, resolvi marcar o meu primeiro estudo já para a semana seguinte.

O tão esperado dia finalmente chegou e eu ia ter minha primeira lição. Nessa ocasião, porém, quem veio me dar aula não foi aquela senhora, mas sim sua filha, Lídia. Ela era uma morena de vinte anos, serena e bonita. Ela me disse que há tempos estudava a Bíblia, mas sempre procurava ir além da letra morta. Ela desvendava o que estava oculto nas palavras. Começamos estudando o capítulo referente ao Gênesis. Líamos o texto e depois eram feitas perguntas sobre o assunto. Eu sentia que tudo tinha um sentido. Quantas verdades! Meu interesse só aumentava. Saber sobre Deus me fascinava. Lídia ficava surpresa com minha facilidade de assimilação e meu interesse por Deus, apesar de meus 12 anos.

Como era bonito o capítulo do Gênesis! A Terra já tinha sido um paraíso: havia árvores majestosas, os animais eram mansos, e flores belíssimas adornavam os seus jardins. Deus havia criado tudo em seu Amor. A natureza era uma eterna devota do Criador. Ele criou o homem e o colocou dentro desse oásis para que ele estendesse essa harmonia por toda a Terra.

Perguntei à Lídia por qual razão não vivemos nesse paraíso. Ela me respondeu que o perdemos porque o homem resolveu lutar contra o Amor, separando-se do Todo. Ele desobedeceu a Lei, comendo o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. Assim, saiu do estado de inocência e entrou no de julgamento. Então, ele percebeu que estava nu; sentiu vergonha e se escondeu de Deus, caindo em culpa.

– Lídia, qual é o significado da árvore do conhecimento do bem e do mal?

– Significa tomar para si a responsabilidade pelos próprios atos – ela disse. – Naquele momento, quando o homem saiu da Vontade Superior, entrou no seu livre arbítrio. Deixou de viver na Luz de seu Criador e caiu nas trevas de sua própria ignorância. Desde então, o homem vem experimentando toda sorte de sofrimentos.

Achei os estudos interessantes, mas algo me intrigava e resolvi perguntar:

– Lídia, então o homem vai sofrer sempre? Não há uma saída para ele? Houve um erro de Deus?

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