Um Cão ao Telefone
e outras crônicas


Prefácio:


Escrever contos é muito mais fácil do que escrever romances – esta é uma retumbante tolice com mais de 500 anos de existência.

E não estou exagerando. O melhor exemplo vem de Tolstói. Seu imenso romance “Guerra e Paz” é tido como a mais importante obra de todos os tempos. São mais de duas mil páginas em papel bíblia.

Mas é ele mesmo, Tostói , o autor de “A Morte de Ivan Ilich”, com apenas oitenta páginas, que é, simplesmente, uma pequena história com todas as características de um conto.

Acredito, talvez, que seja necessário dar exemplos brasileiros. E, com certeza, ninguém melhor do que Machado de Assis, autor desta frase:

“É um gênero difícil, a despeito de sua aparente facilidade”.

E o que dizer de Allan Poe? Chamado de mestre e de teórico, no gênero, ele liquida, sob alguns aspectos, o destino do conto:

“Temos necessidade de uma literatura curta, concentrada, penetrante, concisa, ao invés de extensa.”

Seria desnecessário e exaustivo enumerar a relação dos que defendem a tese de que escrever contos é mais difícil do que escrever romances. Mas também não seria correto não mencionar a frase de Jorge Luis Borges, em seu “Elogio da Sombra”:

“Reforcei meu gosto pela forma do conto, cujos elementos indispensáveis são economia, meio e fim claramente determinado.”

É bom lembrar que há contos longos e romances curtos e, muitas vezes, eles se misturam. É como se o escritor, após escrever umas trinta páginas, descobrisse, de súbito, que precisava ampliar seu texto em mais umas noventa páginas. Ou o oposto, que se dá quando o escritor percebe que seu fôlego criador não vai além de umas trinta páginas.

Cabe, ainda, lembrar que a definição do que é crônica, conto, histórias, historietas, romances, narrativas, as novelas do passado e das atuais sofreu modificações básicas. As novelas de TV, notadamente, repetem o que Dostoiévski utilizou em muitas de suas obras-primas: terminar cada capítulo com a informação para o leitor de que o próximo episódio revelará fatos muito mais misteriosos e empolgantes. A televisão vive disso.

Théo Drummond, neste seu livro, utiliza-se desse recurso: seus textos navegam, essencialmente, para o conto tradicional, para a crônica, a historieta e o artigo. E, ao mesmo tempo, recorre, no final das coisas que escreve, a um final que todos os leitores esperavam. O nome disso é a velha chave de ouro. E, sem maiores preocupações sobre se seus textos são isso ou aquilo, eles são, exatamente, isso e aquilo. Esse é Théo Drummond, um escritor difícil de ser imitado.

A obra

Théo Drummond é um escritor múltiplo. Ele não se repete. E faz mais do que isso: em todos os seus livros há uma constante: neles não se agride ninguém, não se insulta ninguém, não se utilizam palavrões e não se odeia ninguém.Théo se alimenta do dia a dia dos seres e das coisas, das lembranças dos risos e das tristezas. Nada mais do que isso.
Numa de suas novas histórias ele se refere, com doçura, à queda de uma corujinha em sua varanda.

Em outra, ele brinca com uma notícia de que um modesto químico japonês, chamado Manoel, havia inventado uma margarina cuja matéria-prima era cocô, e de custo zero.

As exigências de uma candidata a empregada doméstica numa casa de família são uma delícia. Ela quis saber quantas pessoas moravam na casa, qual o tamanho dos cômodos, quantas horas teria que trabalhar e por aí em diante. O final da história é muito engraçado.

Por essas e outras vale a pena ler “Um Cão ao Telefone”, onde, com certeza, o leitor vai se encontrar em alguns dos episódios que compõem este livro.

Raul Giudicelli
Jornalista e escritor